REFLEXÃO SOBRE A GESTÃO PARTICIPATIVA
Data: 06/08/2017
REFLEXÃO SOBRE A GESTÃO PARTICIPATIVA
Philippe Guédon (*)
A Constituição Federal afirma, entre os seus Princípios Fundamentais, que “todo o poder emana do povo”. Mas os seus autores não se pejaram em repassar este poder todo para os partidos, pouco mais adiante, reservando ao povo o poder-dever de votar em alguns dos candidatos pré-selecionados pelo monopólio dos partidos políticos.
O Estatuto das Cidades é um hino à gestão participativa de pouca serventia prática. Os Poderes abominam a gestão participativa e têm por norma usual a sua esterilização, preferindo estimular a louvação entoada em troca das migalhas que deixam cair das mesas onde se empanturram com lautas refeições.
A primeira lição fica assim expressa: o poder não mais emana do povo, de quem foi surrupiado. E a gestão participativa virou mito, dada a submissão maior dos mandatários a seus partidos, facilitada pela omissão dos fiscais da Lei.
Acontece que os moradores da “pequena aldeia de irredutíveis” concebida pelas historietas de Asterix e Obelix espalharam-se pelo mundo. No país pipocam êmulos destes bastiões de teimosia que se recusam a aceitar o arquivamento de um Princípio Fundamental da Constituição. Em Petrópolis/RJ, também contamos com espécimes representativos desta diáspora.
Queremos praticar a gestão participativa nos termos da Lei e em todo o seu alcance. Para tanto, precisamos reconhecer um impasse inicial: vemos os nossos Governantes como representantes do povo, porém eles se vêem como feitores do dono temporário do Município, o partido tal ou qual. Só uma verdadeira reforma eleitoral e partidária resolveria a parada, mas ela não acontecerá tão cedo por depender do voto das bancadas partidárias para limitar os privilégios dos seus partidos. Também não chega a ser animadora a constatação que a Justiça não enxergou algo estranho desde 1988 na primazia de um inciso de um parágrafo de um artigo (inciso V do parágrafo 3º do artigo 14) sobre um Princípio Fundamental com o qual entra em claro confronto.
Sob outro prisma, já confirmamos em Petrópolis o acerto do teorema que afirma Inexistir livre participação em iniciativas que não contem com independência financeira. Lá onde não há grana, surgem as carências e o Poder, esfregando-se as mãos, as usa para poder cooptar os atrevidos. Vem prá cá que eu resolvo o seu problema.
As nossas iniciativas comunitárias precisam ser auto-sustentáveis. A Sociedade que paga tributos para custear a ineficiência governamental, precisa gerar entidades no seu seio que efetuem ações participativas ou de controle bem administradas, e que posam dispor de militância capacitada e de recursos necessários e suficientes para assegurar independência e continuidade. A economia proporcionada no setor público pela ação fiscalizadora de tais entidades, que buscarão nos servidores seus parceiros naturais, superará por larga margem o custeio das iniciativas populares.
Tais ações nos levarão, de modo irresistível, à criação de redes intermunicipais e à exigência de reformas políticas que quebrem o monopólio partidário de seleção de candidatos, com o advento dos independentes. Não podemos aceitar a hegemonia partidária; as ferramentas da prática democrática tornaram-se as destinatárias de todos os privilégios. Voltar à uma lógica saudável na matéria é a melhor causa que possamos defender.
(*) Coordenador da Frente Pró-Petrópolis