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  SERÁ POR AÍ?

Data: 15/07/2014

 

 

Será por aí?

Terça-feira, 15 de Julho 2014

 

            Acompanhei o projeto “Levanta-te, Menina” da Associação Jean Yves Olichon (“ASSOJYÔ”), durante anos, como acompanhei os trabalhos de Alcindo e Márcia no bairro Independência, de António e Cidália na Reciclagem de Emaús, e alguns outros mais em Petrópolis. Fiquei muito triste ao saber do encerramento do “Levanta-te, Menina” ao final de 2013, embora a equipe que o gerenciava já elaborasse nova iniciativa social. 

            A principal animadora da obra, Sra. Béatrix Olichon, aceitou  elencar-me as causas principais do triste fim do projeto.  A primeira, foi falta de recursos financeiros.  A SETRAC municipal sempre ajudou contribuindo com o per-capita para cada jovem acolhida. Porém, toda a estrutura do projeto fora montada para acolher 20 jovens em situação de risco; a nova visão do  Congresso Nacional sobre o tema tornou-se desfavorável à acolhida por obras sociais, preferindo soluções familiares, quer na família biológica, quer junto a uma família voluntária. Face a esta orientação, a Casa somente abrigava, ao final do ano passado, nove meninas em vez de vinte. A receita dos repasses era menor, mas não a maioria das despesas do Projeto (salários, luz, telefone, contabilidade, administração, seguros, etc.), o que gerava desequilíbrio; este, por sua vez, acarretava dívidas. E pessoas que desejavam dedicar-se ao bem-estar de vinte meninas e adolescentes, tinham que transformar-se em gerentes financeiros. Outra praia, outros talentos.

            Vivemos época, acrescenta Béatrix Olichon, quando dá-se primazia aos direitos sobre os deveres. As educadoras, de um modo geral as profissionais que lidavam com as acolhidas, deviam respeitar limites muito estritos para a sua atuação e conceder crescente liberdade às jovens, resgatadas de quadros de vida desestruturados. Esta tendência refletiu-se em dificuldades operacionais, e estas no aumento de causas de natureza trabalhista, agravando ainda mais a situação.

            Creio útil traçar um paralelo: eu testemunhei o triste fim das atividades de reciclagem de EMAÙS por ensejar esta que pessoas levadas a morar nas ruas de Petrópolis tentassem reencontrar a si mesmas trabalhando de modo progressivo  na reciclagem. Não era hábito assinar carteira nos primeiros tempos de sua atuação, pelo óbvio motivo que não conheço nenhum responsável por pessoa jurídica que se arrisque a assinar carteira de trabalho de pessoa que vive em estado de alcoolismo residual e ainda à mercê de recaída, e precisa primeiro, sair desse estado para poder pretender a trabalho regular e formal.

            Fico me perguntando se, num caso como no outro, a sociedade saiu ganhando com o encerramento das atividades de dois projetos importantes. Será que o rumo apontado pelos legisladores, que não se sentem sequer obrigados a comparecer ao Congresso neste mês dedicado ao futebol e às eleições, atende ao interesse da sociedade e dos principais interessados, no caso as jovens em situação de risco e a população de rua? Os erros e os excessos me parecem estar aqui na ação do legislador, seja do Poder Público, e não do lado dos ativistas sociais.

            Um índice comparativo recente entre o Brasil e os Estados Unidos apontou que, lá, 100% das mestras que atuam na Educação Fundamental têm formação superior. Mas sei do respeito que despertam inúmeras professoras do interior de nosso país, por ensinarem em barracos sem luz, tendo que fazer o almoço das crianças-alunas e se virar para ajudar na segurança do retorno dos miúdos às suas casas. Algum bacharel americano ou brasileiro se anima? E o salário, ó...

            Impomos normas, severas além do bom-senso, aos que tentam empreender, inclusive no campo social. Quando acontece o previsto - os animadores reconhecem a inviabilidade do esforço e fecham as portas - os recursos aparecem e as normas são relaxadas.  O exemplo do convite aos médicos cubanos e de outras nacionalidades; atropelando as leis e abrindo a porta do cofre, atende ao provérbio “Roma lcuta, questio finita”. Mas não atende à ética nem resolve o  problema. Não seria preferível, mais barato e eficiente, apoiarmos o que merece ser apoiado, sem fingirmos que o papel, que tudo aceita, resolverá a parada?

            Anos passados, visitando extensas culturas de morangos no interior de São Paulo, ouvi a seguinte resposta dada a alguém que perguntara por que a escolha desta fruta como produto base na região: “Aqui já foi área de açúcar e álcool e de café. Quando criaram Institutos para administrar as nossas produções, choveram regras. Agora, plantamos morangos. Quando o Governo criar o Instituto do Morango, escolheremos outra atividade...”. Li a mesma reação à proposta de intervenção na CBF pelo Governo: seria o único desastre pior do que os 7 x 1.

 

Philippe Guédon

 




 

 

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