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  Garfadas eleitorais

Data: 26/02/2014

Garfadas eleitorais

Criado em Quarta, 26 Fevereiro 2014 11:00

01 – Afirma a Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Os eleitos são, portanto, os representantes dos 200 milhões de pessoas que compõem “o povo” brasileiro? Não é bem assim, só 140 milhões são eleitores  e podem votar. 60 milhões não piam.
02 – Pior: os eleitores só podem votar em quem os 32 partidos selecionaram. O voto é obrigatório, mas os únicos nomes que foram inseminados nas urnas são os indicados pelos 32 partidos. Por que? O Brasil é um dos raríssimos países (menos de 7%) que veda as candidaturas independentes de partidos. Na política, a “reserva de mercado” é permitida, provavelmente porque as leis são feitas pelas bancadas dos partidos, os maiores interessados... 
03 – Ingênuos podem pensar que os partidos são compostos pelos eleitores. Informa o TSE em seu site que os partidos contam com 15 milhões de filiados (sem recadastramento obrigatório, que dividiria este número por 3, creio). Conclusão: dos 140 milhões de eleitores, apenas uns 10% podem participar da escolha dos candidatos. Em relação aos 200 milhões de integrantes do “povo”, estamos em 7%... 93% do “povo” ficam de fora.
04 – Todas essas garfadas foram decididas pelos partidos sem nenhuma possibilidade de contraditório (este mesmo assegurado aos marajás da Câmara e Senado, para evitar-lhes algum prejuízo pessoal). Nem plebiscito, nem referendo, embora instrumentos constitucionais da soberania popular (artigo 14).  Realizados, desde 1988, uma vez cada um!
05 – Acabou, não.  Será que os filiados têm direito à palavra na seleção dos candidatos? É o que diz a Lei eleitoral (9.504/97, também elaborada por “eles”) no seu artigo 8º: “A escolha dos candidatos pelos partidos e a deliberação sobre coligações deverão ser feitas no período de 10 a 30 de junho do ano em que se realizarem as eleições, lavrando-se a respectiva ata em livro aberto e rubricado pela Justiça Eleitoral”. 
06 – Piada de salão. Convenção eleitoral de junho bate bumbo, toca corneta, exibe faixas, aplaude e assina embaixo das “nominatas” que já vêm prontas. E olhem que só delegados – simples filiados - não têm voz e voto nas Convenções regionais e na nacional. 
07 – Cito frases colhidas na edição de O Globo de 25 de fevereiro: “Quem controla o PSB é Campos, e quem controla o PT é Lula” (Merval Pereira). “O PSOL lançou ontem, em São Paulo, a chapa do partido ao Palácio do Planalto” (pág.6).  Pesquisas relacionam três nomes há meses, em óbvio prejuízo para outros possíveis candidatos, mas não parecem chocar ninguém. Pergunto: e se o “povo” não se sentir contemplado por nenhum dos candidatos à Presidência (ou outros cargos), escolhidos em processos internos sem transparência, pode fazer algo? Ficar em casa, votar em branco ou nulo, o que não mudam nada para os partidos, obrigado.
08 – Dizer que todo o poder emana do povo, em matéria eleitoral, não corresponde à verdade. Alguns punhados de dirigentes partidários (estimo que uns 300 no total) definem os nomes entre os quais poderemos escolher o melhor ou o “menos pior”. “Todo o poder emana do povo” sofreu poda  colossal, sem respaldo, impune.  Enquanto as candidaturas avulsas não forem permitidas, não vejo legitimidade no sistema que me parece ofender conceitos constitucionais e legais a rodo. Ter que ouvir que “cada povo tem os mandatários que merece”, nessas condições, é dose!
09 – Peço permissão para acrescentar um PS. Acompanhei a trajetória política de Roberto Jefferson desde os tempos em que apresentava programas na TV. Seguimos caminhos totalmente diversos; só sei das cicatrizes e alegrias que colecionei. A par de acreditar que Roberto Jefferson prestou relevante serviço ao Brasil ao divulgar a existência do “mensalão”, impressionou-me a sua postura nos últimos meses. Exibir elegância e firmeza em momento tão difícil da vida quanto este, força a  admiração. 

 Philippe Guédon 




 

 

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