Antonio Pastori (*)
Passados 132 anos da chegada do primeiro trem à Petrópolis (fev/1883) - e meio século da sua erradicação -, eis que um trem retorna à nossa Cidade. Bem, não é um treeeeem no seu sentido pleno, mas sim uma pequena locomotiva a vapor que operou por muitos anos na antiga Cia. Petropolitana de tecidos, manobrando vagões de carga no pequeno ramal que havia entre essa fábrica e a linha Leopoldina, próximo à Estação Cascatinha.
Com a ajuda da ex-vereadora Wilma Borsato, conseguimos saber parte da história dessa loco. Nos anos 1950, a fábrica abandonou a tração a vapor e passou a fazer à movimentação de seus produtos em caminhões. Esquecida num canto foi vendida na década de 1960 para um ferro-velho em Barra Mansa, ainda em condições operacionais. Em 1967 foi adquirida para compor um parque infantil da EBAL-Editora Brasil América, que publicava incríveis revistas em quadrinhos (gibis) como Tom&Jerry, Pernalonga, Superman, Batman e muitos outros personagens ao gosto da garotada.
Na EBAL ela ficou estática e foi estilizada como locomotiva do velho oeste tornando-se destaque na entrada do imponente prédio da Editora. A EBAL foi à falência na década (perdida) nos anos 1980 e o prédio virou uma escola. Sem nenhuma manutenção a loco foi deteriorando-se ao tempo: a cabine de madeira do maquinista apodreceu e foi retirada; sua chaminé, fornalha e os dois tanques de água laterais viraram depósito de lixo; a estrutura estava quase toda em estágio avançado de ferrugem, exceto as seis rodas; todos os comandos, alavancas, apito, sino, farol, mostradores, etc., foram suprimidos. Para agravar o quadro, ela foi cimentada no chão com a massa cobrindo a metade das rodas. Um horror!
Por pouco ia vira sucata, não fosse a intervenção do incansável preservacionista, o Engo. Luiz Octavio da Silva Oliveira, fundador da AFPF-Associação Fluminense de Preservação Ferroviária, que não descansou até comprá-la do atual proprietário do imóvel (a escola fechou). Sua remoção se deu em 15/05/2011, quando foi transportada para uma oficina em Nogueira, graças à ajuda da rapaziada da Regional Petrópolis da AFPF e da valiosa CONDEP.
Apesar de ter sofrido uma boa limpeza, a loco encontrava-se ainda em estado lastimável até que em 2014, por empenho do Engo. Luiz Veiga, da Regional, a FCTP-Fundação de Cultura e Turismo de Petrópolis destinou verba para o restauro desse raro equipamento que vai fazer parte da história da Indústria petropolitana.
A tarefa foi entregue ao restaurador Moysés Naine, que construiu alguns trenzinhos e bondes para as novelas da Globo. Vai retornar novinha em folha e em condições de rodar, segundo Moysés. A velha loco foi batizada com o nome de Baroneza II em homenagem a primeira locomotiva que trafegou em solo brasileiro em 1854, pela pioneira E. F. de Petrópolis (vulgo E. F. Mauá). Portanto, não foi um restauro somente cenográfico. A Baroneza II vai ser instalada em local reservado, com trilhos, em frente à estação, no próximo final de semana.
Para que se tenha ideia da importância desse fato foram catalogados menos de 500 exemplares de locomotivas a vapor no Brasil. A maioria está estática em praças públicas, nem sempre em bom estado de conservação. Outras estão escondidas em depósitos, oficinas ou esquecidas no meio do mato. Poucas, muito poucas, ainda estão em plena operação, tracionando TTCs-Trens Turísticos e Culturais.
Com isso Petrópolis passa a ter duas locomotivas que aqui trabalharam por muitos e muitos anos. O outro magnífico exemplar está cuidadosamente preservado no Museu Imperial, uma loco-cremalheira que tracionava os trens pelo plano inclinado de meia légua entre o Alto e a Raiz da Serra da Estrela. Trata-se do único exemplar que restou dentre as cinco que foram aqui fabricadas nas Oficinas do Alto da Serra, nossa “Embraer” da época.
Parabéns a todos que se dedicaram nessa empreitada. Fatos como esse renovam a nossa esperança de que o trem Rio-Petrópolis (Expresso Imperial) entre um dia na passarela da modernidade e nos livre dos congestionamentos infindáveis. Acreditem, faltam somente sete km de trilhos para ligar o Expresso à linha da Supervia e ir direto ao Rio em 1h:30 com conforto, segurança e rapidez. Oremos, pois, para que um dia possamos gritar a pleno pulmões: Olha o trem ai, gente!
(*) Pesquisador ferroviário. Contato: antonio.pastori53@gmail.com