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  Neoliberalismo na América Latina – Samuel Pessôa

Data: 05/06/2016

 

Neoliberalismo na América Latina – Samuel Pessôa

 
- Folha de S. Paulo
 
De 1994 até 2008, a política econômica seguiu receituário "neoliberal". A expressão não é precisa pois nesse período a carga tributária e o gasto social se elevaram. Mas houve ortodoxia na macroeconomia e implantação de agenda que visava a redução do intervencionismo estatal, esta desfeita em 2006, com a troca de guarda na Fazenda.
 
O regime de política econômica, em resposta à crise global e à euforia causada pela descoberta do pré-sal, mudou de vez em 2009. Até 2010, aos trancos e barrancos, melhorávamos continuamente. A partir de 2011, passamos a piorar continuamente.
 
A heterodoxia brasileira argumenta que o ajuste fiscal de 2011 tirou a economia dos eixos e que os estímulos fiscais de 2012-2014 foram ineficazes. Ou seja, colocaram os heterodoxos errados na Fazenda. Teremos de esperar um novo governo de esquerda para tentarmos a heterodoxia correta.
 
Comparação interessante é do Chile com a Argentina. O Chile, mesmo nos governos de esquerda, pratica política econômica dita neoliberal. Já a Argentina casou com a heterodoxia econômica desde 1940, com algumas breves interrupções. Os anos Kirchner, em particular, foram um festival de heterodoxia.
 
Em 1990, a renda per capita da Argentina, segundo o FMI, era de US$ 7.213, enquanto a renda per capita do Chile era de US$ 5.846. Os dados estão em dólares constantes comparáveis, isto é, controlando por diferenças sistemáticas de custo de vida entre as economias.
 
O Chile cresceu lenta e ininterruptamente, de forma que hoje a sua renda per capita é 21% maior do que a argentina. Os dados de PIB argentino incorporam a revisão das contas nacionais que será divulgada no próximo mês, que reduzirá o crescimento no período de 2002 até 2014 de 5,6% ao ano para 4,2%.
 
Crescimento de 4,2% ao ano parece bom. Não é o caso, pois em 2002 a base estava extremamente deprimida em razão da crise econômica que resultou na alteração do regime cambial: entre 1999 e 2002, o PIB da Argentina recuou 20%.
 
Mas o legado dos Kirchner não é somente de baixo crescimento. Houve também aumento consistente da inflação, que se encontra hoje na casa de 35% ao ano.
 
Finalmente, podemos olhar outra dupla de países. Colômbia e Venezuela são dois vizinhos muito parecidos em diversas medidas. Em 2000, o PIB per capita da Colômbia era de US$ 6.621, enquanto o PIB per capita da Venezuela era de US$ 11.627, também em dólares internacionais constantes. O PIB per capita da Colômbia era 57% do da Venezuela.
 
A Colômbia cresceu lenta e ininterruptamente ao longo de todo esse período, de forma que hoje o PIB per capita da Colômbia é 83% do PIB per capita da Venezuela, segundo as estatísticas oficiais, que, como no caso argentino, devem ser revistas para menor quando e se o chavismo sair do governo.
 
Todas as indicações que temos são que a pobreza tem crescido muito na Venezuela (não há dados oficiais) e a inflação explodiu, enquanto na Colômbia a pobreza tem caído ininterruptamente –em 2000, a taxa de pobreza era de 28% da população e em 2013 foi de 14%, e a inflação está controlada.
 
A Colômbia pratica políticas que nossos economistas heterodoxos nomeiam de neoliberais.
 
O rumoroso trabalho recém-divulgado do FMI criticando o neoliberalismo –leia a coluna de minha colega Laura Carvalho neste espaço na quinta-feira (2)– definitivamente não foi escrito para a América Latina.



 

 

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