Angelo Romero (escritor)
Há vinte anos, quando vim morar em Petrópolis, não vi um só “flanelinha” nas ruas. Não existiam. Dias atrás li uma nota no “Les Partisans” - seção que aprecio - redigida de forma irônica, creio eu. Dizia que os turistas que nos visitam já estavam sendo beneficiados pelo serviço dos flanelinhas, pois que eles já atuavam em áreas nobres de Petrópolis, assim como na entrada principal do Museu Imperial, entre outros pontos. Apreciei a ironia. Mas, afinal, o que vem a ser um flanelinha? Um servidor público municipal a serviço da sociedade? Um agente de turismo qualificado para exercer a função, ou um esperto desocupado que se beneficia, alugando um pedaço de rua que não lhe pertence? Já proliferaram. Alguns esperam o término da cobrança pelo estacionamento na via pública, para começar a atuar. E o motorista se ferra, deixando de pagar uma cobrança injusta, porém legal, para passar a sustentar desocupado. É melhor pedir do que roubar – dirão alguns, principalmente aqueles que não possuem automóvel Mas ainda está muito bom por aqui. Por enquanto eles pedem um trocado para olhar pelo carro de quem estaciona. Foi assim que começaram a atuar no Rio, tímida, discretamente, e tratando o motorista por doutor. Como não houve repressão por parte das autoridades, muito pelo contrário, pois o que existiu e existe é a parceria com policiais corruptos, designados para fiscalizar e policiar o trânsito, o negócio prosperou. E tanto, que atingiu as raias do absurdo, transformando um tímido pedido, por imposição de uma taxa de cobrança variável, de acordo com o local. Em áreas nobres, ou seja, próxima às grandes casas de diversão e teatros, o preço dobra. E ai do infeliz motorizado que não pague adiantado para estacionar. Certa ocasião estacionei meu carro próximo ao Circo Voador, onde haveria um grande show. O flanelinha da área me cobrou um valor absurdo, quase igual ao que eu teria que pagar na compra do ingresso, e exigia o pagamento adiantado. Chiei. Depois de discutirmos algum tempo, concordei em pagar, desde que fosse à saída, ou seja, ao final do espetáculo, pois assim eu saberia que ele faria por merecer por ter tomado conta do meu carro. O flanelinha não concordou e me fez veladas ameaças. Resolvi correr o risco, mantendo minha proposta.
Ao sair do Circo Voador às 4 horas da manhã, cansado, com sono e até com fome, encontrei meu carro com dois pneus furados. Se fosse um dos pneus eu o trocaria, apesar da hora e do cansaço, mas dois... Sentei no meio-fio, chorei de raiva e fiquei imaginando o que eu seria capaz de fazer caso tivesse encontrado o flanelinha. Outros casos não tão graves aconteceram. Por ser uma ocupação de um infeliz desocupado, vivendo à margem da sociedade, e que não foi combatida a tempo, fez propiciar a inclusão de verdadeiros marginais, bandidos violentos e perigosos. Resumindo: decidi vir morar em Petrópolis para fugir da violência do Rio e também, porque não dizer, de seus flanelinhas.
Petrópolis era uma Cidade pacata, quando aqui cheguei. Porém, justamente por ter um povo ordeiro, despreparado para o crime, e também por sua proximidade com o Rio, tornou-se refúgio e alvo ideal para ladrões, assassinos e traficantes. A apreensão de drogas pesadas pela Polícia, como a cocaína, é noticiada diariamente. O bandidinho que assaltava bolsa de mulher na Rua 16 de março, hoje, bem municiado por armas pesadas, já troca tiros com a Polícia. Este jornal noticiou o fato. O que foi cenário para filmes e novelas dos principais canais de televisão se transformou em cenário para tragédia, fazendo relembrar os negros tempos da Máfia e de Al Capone. Por não ter havido imediata repressão aos flanelinhas e aos bandidos desarmados, não creio mais que possamos reverter esta situação. Desculpe caro leitor, meu pessimismo, mas creio que estamos caminhando para o fundo do poço.
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